De acordo com Antônio, o filho David, de 4 anos, é quem o dá força para seguir adiante, mas o trauma ainda é grande
PUBLICADO EM 04/02/19 - 19h34
RAFAELA MANSUR
Com três costelas quebradas, a perna machucada e dificuldade de movimento das mãos, o ajudante geral Antônio França Filho, de 55 anos, diz que o dia 25 de janeiro tornou-se sua nova data de aniversário: "Deus me deu outra chance". Ele trabalhava para uma empresa terceirizada da Vale, em Brumadinho, a cerca de 500 metros da barragem que se rompeu.
Antônio atuava na parte superior de uma estrutura de ferro criada para a implantação de placas de sinalização. Ele e os colegas haviam acabado de voltar do almoço quando a barragem rompeu. "Achei estranho porque vi um funcionário da Vale correndo e perguntei para o meu colega por que será que ele estava daquele jeito, mas não teve tempo nem de resposta, veio um baque da lama contra a parte de baixo da da instalação. Começamos a gritar e foi um desespero total", conta.
A estrutura em que ele e os colegas estavam caiu, e Antônio ficou preso às ferragens. "Quando dei por mim, pedi a Deus que desse força para a gente, porque eu não sabia o que estava acontecendo. Para mim, o mundo estava acabando", diz. Segundo ele, houve um segundo baque e, depois, silêncio. "Quando eu abri os olhos, estava aquela poeira e não tinha mais barulho nenhum, mas eu estava preso às ferragens, eu não conseguia mexer nada, só minha cabeça e meus braços".
Ele conta que começou a gritar os nomes dos amigos e a pedir socorro, mas ninguém respondia. Duas horas depois, dois funcionários da Vale o encontraram e, com a ajuda dos bombeiros que chegaram em seguida, ele foi resgatado. Só depois de ser retirado das ferragens e levado para um local seguro, ele entendeu o que havia acontecido. "O que era estrada, instalação, homens trabalhando, equipamentos, não tinha mais nada, só lama. Eu não sabia se os colegas que estavam lá em cima comigo estavam vivos, mas eu sabia que os que estavam na estrada, eram mais de 20, não tinham sobrevivido", disse. Antônio foi levado para o Hospital de Pronto-Socorro João XXIII, em Belo Horizonte, onde passou cinco dias internado.
De acordo com ele, o filho David, de 4 anos, é quem o dá força para seguir adiante, mas o trauma ainda é grande. "Quando chega a noite é pior. Eu deito e não consigo dormir, com dor no corpo e com aquelas imagens na cabeça. A gente fica mais tempo no trabalho do que em casa e os colegas se tornam uma família", desabafa. "É muito triste, porque debaixo daquela lama tem muita gente ainda. O que aconteceu não foi fácil, não, a cada dia a gente vai buscando forças para tentar passar por isso e seguir em frente".