O TRATO CAFAJESTE QUE DESPREPARADOS DA CULTURA EM ITABIRA DERAM A UMA DAS MAIORES PINTORAS DO BRASIL
(“Fui maltratada e meu trabalho, vilipendiado”)
Não é 100% ético violar segredo postal, mas decidi fazê-lo para reforçar ao itabirano como é perigoso aceitar incompetentes em postos de decisão, como é prejudicial eleger políticos apequenados, que nomeiam para a cultura, pasta fundamental para Itabira, gente incapaz de lidar, num padrão razoável de civilidade, com artistas.
Publicarei a carta de Yara Tupynambá e proponho uma reflexão ao leitor: se a cultura de governos anteriores tratava uma das maiores pintoras do Brasil do jeito que se conhecerá a seguir, imagine como era o relacionamento com artistas menores.
CARTA DE YARA TUPYNAMBÁ AO TREM
não sei se você sabe, mas quando meu painel A Mesa passou às mãos da prefeitura de Itabira, depois de percorrer por minha conta cerca de 12 cidades mineiras, fiz advertência de que deveria ser protegido por placa de acrílico para evitar danos. Nos dois primeiros anos, ficou na entrada do teatro, na Fundação Carlos Drummond de Andrade, bastante cuidado e sem estragos.
Posteriormente, em outras gestões, foi levado para a parte de baixo, desmembrado e colocado em cavaletes, não da forma ordenada que eu havia dado ao poema, mas... Enfim, ainda estava, de certa forma, conservado. Outra vez adverti às pessoas da direção da Fundação que o painel precisava, mais do que nunca, de ser protegido por placa de acrílico. Nada disso aconteceu.
Quando aí estive para fazer um diagnóstico, em viagem não financiada pela prefeitura, e sim por minha conta, não recebi sequer a atenção do secretário de Cultura, que poderia ter me dado boas-vindas e agradecer por meu trabalho gratuito. Ao contrário, quando pedi uma xícara de café para me renovar do exaustivo trabalho que estava fazendo, por volta de 11h30, tive como resposta: ‘Vá até o botequim da esquina, lá tem café’. Fiquei absolutamente desconsertada e fui à esquina tomar o café.
Não quis voltar mais a Itabira, nem mesmo tomar conhecimento desse que é um dos mais importantes trabalhos de minha carreira. Fui maltratada e meu trabalho, vilipendiado.
Não fui eu que fiz o orçamento que mais tarde foi pedido pela prefeitura e sim uma restauradora chamada Carla. Eu poderia ter trabalhado junto, mas nem sequer um telefonema recebi de Itabira. Como vê, a cidade me ignora e despreza o que fiz.
Fico feliz de saber que você está alertando novamente para a conservação deste bem que extrapola meu próprio trabalho. É a vida de Drummond através de um importante poema sobre sua família e que foi, na edição do livro que fizemos mais tarde, acompanhado por cartas que o poeta me dirigiu sobre a amizade que entre nós existiu.
Espero que as coisas tomem rumo melhor em Itabira. Agradeço a você, sinceramente, e me coloco à sua disposição.”
RESPOSTA DO TREM A YARA TUPYNAMBÁ
em nome dos itabiranos que amam a arte e compreendem cultura como desenvolvimento, peço desculpa pelo trato obtuso dispensado à senhora e a seu estupendo painel A Mesa, que já vi comover brasileiros de vários estados em visita à Casa de Drummond.
Depois que o governo Jackson Tavares (1997-2000) comprou os quadros, assumiu Itabira um grupo político asselvajado, obscurantista e inculto, que torturou o município por longos 20 anos, mas trago-lhe boa notícia: a malta foi digitalmente defenestrada em 15 de novembro.
Sob nova direção desde janeiro deste ano, a cidade vive enorme expectativa de que as artes plásticas, o teatro, a literatura, a música, o conhecimento e a altaria voltem a ter vez, coletivamente. Tenho certeza de que o restauro de seu e nosso painel está entre os projetos do atual governo para a pasta da cultura, sob a liderança do prefeito Marco Antônio Lage.
O TREM acompanhará todo o processo, na forma do jornalismo, e continuará dando-lhe notícias, até que A Mesa seja recuperada e a todos volte a oferecer banquetes de emoção.
Abraço e continuemos em linha.
Marcos Caldeira Mendonça,
editor dO TREM Itabirano.”
Fotos: um dos 19 quadros que formam o painel A Mesa
(aqui sem danos, em imagem de arquivo) e a artista Yara Tupynambá.