Do alto do aglomerado da Serra, a maior favela de Minas Gerais, Isabela Rodsil, que acabou de completar 18 anos, deixou de focar sua vida exclusivamente nos estudos do vestibular de artes plásticas, como havia planejado, para trabalhar e ajudar financeiramente a família. No Coração Eucarístico, na região Noroeste da capital, Clara Terra, que alcançará a maioridade daqui a quatro dias, também adiou os objetivos de tirar a carteira de motorista e de iniciar o curso de arquitetura.
As duas belo-horizontinas, que nem se conhecem e nasceram praticamente juntas com o Super Notícia (o jornal comemora 18 anos nesta sexta-feira, 1º de maio), dividem as mesmas aflições e dúvidas comuns do início da vida adulta, além, agora, das incertezas provocadas pela pandemia da Covid-19.
Uma situação que afeta jovens em todo o país e que, apesar das dificuldades, pode representar um momento de oportunidades, garantem especialistas.
“Esse período representa uma chance para que os jovens possam aprender a lidar com as emoções, o que lá na frente vai ser um diferencial no mercado de trabalho. Todo bom líder precisa ter inteligência emocional, foco e resiliência”, afirma a pedagoga especializada em psicologia da aprendizagem, Izabel Macedo.
O coordenador do Observatório Social da Covid-19 da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Marden Campos, lembra que o início da maioridade sempre é conflituoso. “Estamos falando de uma mudança de papéis, do modo como a sociedade passa a ver aquela pessoa, e isso vem carregado de novas responsabilidades. Espera-se que a pessoa se torne adulta e comece a ter autonomia, o que é um processo complexo”, afirma Campos.
Lições da pandemia
Mesmo com a vida momentaneamente parada, novos adultos não perdem a capacidade de sonhar. Para alguns deles, a vida pós-pandemia poderá ser melhor.
“Não é romantizar, mas é dar valor ao quanto eu sou privilegiada e esquecia. Tenho passado mais tempo com minha família, antes eu saía de manhã e só voltava para casa à noite”, afirma Clara Terra. Para Isabela Rodsil, é momento de solidariedade. “Estou ajudando a distribuir cesta básica. Vamos sair melhores do que entramos nessa situação”, afirma.
Sonho adiado
Recém-formada no ensino médio, Clara Terra tinha tirado o ano para estudar para arquitetura e estava ansiosa também para morar sozinha. “Ia dar os primeiros passos da vida adulta”, conta. Mas aí veio a pandemia. “Já que não dá para fazer nada, que esse seja um momento de repensar a vida”, afirma.
Desenhando o futuro
Nascida e criada no aglomerado da Serra, Isabela Rodsil nunca teve a chance de parar para lamentar. Desde os 15 anos, trabalha no projeto social Remexe, customizando roupas. Mesmo com a pandemia, ela pensa grande: “Acabei de montar com uma amiga uma empresa chamada Aquarela, para modificar roupas com pinturas. Estamos cheias de ideias”, conta.