Em um áudio encaminhado por meio do WhatsApp, na manhã desta segunda-feira (23), o presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Flávio Roscoe, diz que uma “parcela significativa da população tem que ser contagiada (com a Covid-19) porque é assim que vai passar a crise do vírus”.
Ele, inclusive, contraiu o novo coronavírus ao acompanhar a comitiva presidencial, no início do mês, em viagem aos Estados Unidos.
“Eu sei que essa é uma posição que vai contra muito do que a gente tem ouvido aí, o isolamento é necessário, mas acontece que a crise só passa quando boa parte da população for contagiada. Então, uma parcela significativa da população tem que ser contagiada porque é assim que vai passar a crise do vírus. E, 85% (dos infectados), inclusive, é assintomático como eu, que nem senti nada, só uma tossezinha”, afirmou em um dos trechos do áudio.
Em conversa com a coluna, Roscoe explicou que isso não é ele quem fala, mas sim a classe médica: “O contagiado é o infectado. O próprio ministro da Saúde (Luiz Henrique Mandetta) disse que a curva só vai diminuir quando 50% dos brasileiros tiverem (contraído o vírus). Não estou falando nenhum absurdo. Felizmente, grande parte não vai ter impacto (por estar fora do grupo de risco). Eu sou testemunha disso”.
“Medidas insensatas”
No início do áudio, Roscoe explica que o governo do Estado vai corrigir por meio de decreto uma situação recorrente em vários municípios mineiros e que ele considera “equivocada”, onde os prefeitos estavam “cerceando” as atividades de indústrias, principalmente as de alimentação. Ele ainda classificou as medidas como “insensatas” e movidas pelas demandas popular e da imprensa.
De acordo com o empresário, o áudio vazado foi um apenas dos vários que ele enviou a um grupo de WhastApp formado por presidentes de sindicatos patronais do ramo da indústria e não uma declaração pública. No espaço, eles discutiam sobre a necessidade da Fiemg se posicionar sobre atitudes de prefeituras de decretarem “toque de recolher” e não permitirem o funcionamento mínimo de indústrias de alimento, mas ao mesmo tempo não restringir a saída de idosos, que fazem parte do grupo de risco.
Em entrevista coletiva nessa segunda-feira (23), o governador Romeu Zema considerou algumas dessas barreiras como exageradas e que pediria a alguns prefeitos que não impedissem o deslocamento.
“A sociedade não precisa dela inteira produzindo, precisamos de uma parte. Agora, não podemos ter a sociedade inteira dentro de casa igual tem muito prefeito decretando toque de recolher. E aí quando você sai na rua está cheia de idosos e o prefeito não faz nada em relação a isso”, disse à coluna.
O presidente ainda argumenta que isso somente parece absurdo para as pessoas que têm reserva de dinheiro, que estão assistindo a toda pandemia do sofá de casa e com ar condicionado. “Para o cara que não tem onde comer amanhã, o que eu falei é cruel, é vida ou morte para essa pessoa. Essa pessoa vai está aí na rua em pouco tempo. Os impactos na sociedade são violentíssimos. E mais do que isso é porque não tem perspectiva”.
“Tocar a vida o mais normal possível”
Na mensagem enviada aos presidentes dos sindicatos, Roscoe afirma que vai começar a defender a posição de que é preciso voltar à normalidade, em que o comércio retome às atividades e, consequentemente, beneficia a indústria. E, para isso, pede a opinião sobre o tema.
À coluna, ele declarou que a conversa no aplicativo era informal e que a normalidade a qual ele se referia era dentro do que é possível. O empresário avaliou ainda que, “com ou sem coronavírus”, a sociedade precisa do mínimo para sobreviver, e que isso vem dos setores que produzem bens e produtos que essenciais, como alimentos e produtos de tratamento de água.
O presidente da Fiemg diz ainda a proibição total vai gerar efeitos em cadeia de proporções inestimáveis. Em 60 dias, a previsão segundo ele são de 10 milhões de desempregados.
“Sem a indústria de alimento, o alimento não brota no supermercado. Quem vai ficar confinado em casa com fome? Não estou defendendo o lucro, mas sim o mínimo funcionamento da sociedade. Ótimo, ninguém vai morrer de coronavírus, mas as pessoas vão morrer de fome? Em nenhum local do mundo você pode interromper a produção de alimento porque em 15 dias vai ser um colapso de 100% na sociedade”, disse à coluna.
Roscoe cita ainda que, na Fiemg 80% dos funcionários estão em home office, ocorreram mudanças de turno e os idosos acima de 60 anos foram proibidos de trabalhar. Segundo ele, 99% da indústria tomou essas mesmas decisões há duas semanas.
Idosos
Contrariando o que é dito por autoridades da saúde, o empresário sustenta no áudio que a população de até 50 anos não é atingida pelo vírus. Por isso, no entendimento pessoal dele, o governo deveria limitar a saída de pessoas somente acima de 60 anos.
“O que nós vamos ter é uma crise de dimensões nunca antes vistas e que, com certeza, terá um efeito sob a vida das pessoas até pior que o vírus, com efeitos cruéis de mortalidade porque fome, desemprego e recessão também matam. Infelizmente, eu vejo uma fobia geral da sociedade. O que nós temos que fazer, nesse momento, é isolar os mais velhos e tentar tocar a vida mais normal possível”, disse Roscoe no áudio que foi vazado.
Já com a coluna, o presidente da Fiemg declarou que a fala ali fazia parte de outro contexto: “Não é que não são atingidos. Eles têm a doença, mas não vão para os casos graves, para a UTI. Tem pouca letalidade e quase toda ocorreu com quem tinha doença respiratória pré-existente”, explicou.
Infectado
Roscoe diz que foi liberado pelo médico, no último fim de semana, e retornou ontem às atividades na Fiemg, mas com reuniões sendo realizadas por videoconferência e contato mínimo com colaboradores: “Em tese hoje eu não transmito nem pego o coronavírus mais”.
Ele contou que já estava gripado quando embarcou para os Estados Unidos e foi durante a viagem que a tosse se atenuou. Por isso, segundo o presidente, ficou difícil perceber que se tratava da Covid-19.
Quando, no último dia 12, o secretário especial de Comunicação Social da Presidência da República, Fábio Wajngarten, testou positivo para o vírus, o empresário se isolou e realizou o exame que atestou a doença. Roscoe afirmou que o sintoma mais grave que sentiu foi febre na sexta-feira retrasada, do dia 13.
Leia a íntegra do áudio
“Caros presidentes, no decreto acima o governo do Estado corrige uma situação que vinha acontecendo em vários municípios mineiros, onde os prefeitos estão cerceando as atividades, principalmente de indústrias, e de indústrias de alimentação. As indústrias de alimentação estão protegidas agora. Os prefeitos estão impedidos de fazer isso. O decreto ainda não foi publicado, mas será publicado hoje no Diário Oficial.
Eu tenho visto, nos últimos dias, várias medidas de prefeitos cerceando a atividade econômica, das indústrias, inclusive sendo apoiados por setores industriais. Infelizmente, eu entendo que essa é uma posição equivocada. Eu irei começar a defender agora uma posição de que nós temos que voltar à normalidade. A população até 50 anos não é atingida pelo vírus. Na China, entre zero e 10 anos não se teve uma criança sequer que foi a óbito. De 10 a 40 anos o índice é de dois para 1.000. Ou seja, e esses dois provavelmente tinham problemas de saúde mais graves.
O que nós vamos ter é uma crise de dimensões nunca antes vistas e que, com certeza, terão um efeito sob a vida das pessoas até pior do que que o vírus, com efeitos cruéis de mortalidade porque fome, desemprego e recessão também matam. Infelizmente, eu vejo uma fobia geral da sociedade. O que nós temos que fazer nesse momento é realmente isolar os mais velhos e tentar tocar a vida o mais normal possível.
Infelizmente os políticos, os governadores, os prefeitos, movidos ali do calor popular, da demanda popular, da demanda da imprensa, estão tomando medidas que eu considero insensatas, medidas que têm um efeito nocivo na economia que nós não sabemos calcular nem dimensionar. E, que depois do estrago feito, vai ser tarde demais. Eu sei que essa é uma posição que vai contra muito do que a gente tem ouvido aí. O isolamento é necessário, mas acontece que a crise só passa quando boa parte da população for contagiada. Então, uma parcela significativa da população tem que ser contagiada de fato porque é assim que vai passar a crise do vírus. E 85%, inclusive, é assintomático como eu, que nem sente nada, só uma tossezinha.
Então, eu vou me posicionar de uma maneira clara, a partir de agora, e quero ouvir vocês. E vou me posicionar de que devemos sim limitar a saída de pessoas a partir de certa idade, devemos voltar a abertura do comércio porque sem o comércio tá aberto, não adianta ter indústria. Nós devemos solicitar que as pessoas acima de 60 anos tenham restrição para sair de casa, mas só esse grupo. E para restrição com convívio familiar. Essa é minha opinião e quero ouvir a opinião dos senhores. Grande abraço.
Flávio Roscoe, presidente da Fiemg”